Jung Mo Sung
Coord. Pós-Graduação em Ciências da Religião, Universidade Metodista de São Paulo
Fonte: ADITAL
No dia 5 de fevereiro começa em Dakar o Fórum Mundial de Teologia e Libertação, paralelamente ao Fórum Social Mundial. É um bom momento para repensarmos a caminha das mais diversas teologias na perspectiva da libertação ou críticas.
Eu quero enumerar alguns desafios.
A teologia da libertação latinoamericana, no início da década de 1970, assumiu a tarefa de pensar teologicamente as lutas dos pobres e dos seus aliados contra a pobreza, desigualdade e injustiças sociais a partir da teoria da dependência. Esta teoria foi um marco no pensamento sócio-econômico não só na América Latina, mas também em outras partes. Na década de 1980, a realidade econômica mundial mudou e o neoliberalismo passou a ser a ideologia dominante e a ditar as políticas e relações econômicas. Foi uma novidade que muitos da TL não compreenderam muito bem no seu início, tanto que o discurso sobre questões econômicas e sociais da TL mudou muito pouco naquele tempo. Depois, os discursos se concentraram na crítica ao neoliberalismo, mas essa mudança gerou poucas formas novas de crítica teológica, que fossem mais adequadas para o novo tempo. No início do século XXI estamos tendo outras novidades na economia globalizada.
Além do surgimento da China como um dos grandes "atores” na economia mundial e a explosão das "redes sociais” – e o que isso significa em termos econômicos e sociais–, uma das questões fundamentais do nosso tempo é que o Império global de hoje domina por sedução. Os impérios anteriores (até o Império Britânico) sempre usaram força bruta para conquistar e manter a dominação e exploração. Hoje, os povos e países que estão foram do "circuito do Império” desejam entrar e participar do seu modo de vida. É claro que o Império ainda tem a força militar para reprimir os seus inimigos, mas a sua expansão e manutenção se dão ordinariamente por sedução.
A crítica a um sistema tão sedutor assim exige um tipo diferente de crítica teológica. As críticas contra a pobreza não significa mais necessariamente crítica ao sistema, pois pode ser uma demanda para poder entrar nela e viver o seu "modo de vida”. Eu penso que o conceito de "fetiche” (Marx) e de idolatria do Mercado (Hinkelammert e Assmann) podem ser instrumentos muito importantes (e até fundamentais) nesta teológica crítica, de libertação, do nosso tempo.
Um segundo ponto. A TL latinoamericana se constitui tendo como o tema central o pobre, isto é, a questão sócio-econômica. A noção de Deus da Vida, que luta contra as forças de morte e de opressão, gerou também outras teologias críticas em torno de questões como o do gênero (teologia feminista e suas variações), de etnia (a teologia negra, indígena...), o da sexualidade e também da ecologia. O desafio que temos hoje é como articular essas lutas para que cada uma não se perca em sua especificidade ou na "luta interna” para ver qual é a luta mais importante.
Nesta articulação, precisamos perceber que a teologia da libertação privilegiou a relação produtiva, isto é, as relações sociais mediadas pela produção de bens materiais a partir da natureza. Enquanto que outras lutas como a do gênero, etnia e sexualidade tem o foco central nas relações intersubjetivas. As mulheres, negros, indígenas, homossexuais etc desejam ser reconhecidos/as pelos outros e pela sociedade como seres de plena dignidade humana.
O desafio é como elaborar ou assumir uma teoria antropo-social capaz de explicar de uma forma articulada as relações de expropriação, exploração e dominação; isto é, relações produtivas e relações intersubjetivas, e em diálogo com essa teoria elaborar um discurso teológico crítico. (a continuar)
[Autor, com Hugo Assmann, de "Deus em nós: o reinado que acontece no amor solidário aos pobres”].
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